terça-feira, 5 de junho de 2018

Sempre pode piorar

O primeiro acampamento a gente nunca esquece. Depois vem o segundo e o terceiro até que um dia alguém te chama para passar um feriado na fazenda da nova namorada em Miguel Pereira e como a turma toda topa ir, você também topa. É claro que você não acredita que algo possa dar errado, mas depois dessa história você vai mudar de ideia.

Partimos em três carros porque era muita gente e as coisas ficaram estranhas logo no início do percurso, quando um deles se perdeu dos outros dois. É incrível como uma coisa tão grande quanto um carro pode sumir assim, sem mais nem menos. Mas a verdade é que o carro sumiu e a galera que estava na frente resolveu voltar achando que o sumido poderia ter parado por algum motivo técnico, como um furo no pneu. Parece uma boa ideia não é mesmo? Só que não foi.

A gente do carro de trás, que também deixou de avistar os carros à frente, achou que eles estavam mais adiante e seguiu caminho em busca dos companheiros. Assim começou a irritante brincadeira de gato e rato, bem na via Dutra, que durou mais de duas horas. Você deve estar se perguntando porque será que os idiotas levaram tanto tempo para se encontrar e eu vou explicar: ainda não existiam os celulares, ou seja, ninguém falava com alguém o tempo todo e, além disso, três carros em movimento numa rodovia, sempre em direções contrárias, têm pouca chance de se esbarrar, né?

Apesar da pouca chance, depois de muito correr para lá e para cá, os três carros se encontraram novamente em um comércio que havia no início da serra. A essa altura, a noite já se aproximava e para provar o que digo sobre um dia ruim, daqueles em que não se deve sair de casa, o tempo começou a virar, trazendo uma neblina espessa que tomou conta de toda a paisagem. Não era mais possível enxergar um palmo adiante do nariz e foi preciso abrir os vidros, botar as cabeças para fora e reduzir a velocidade do comboio para 20 quilômetros por hora.

Nesse passo de tartaruga, os carros seguiram em frente e enveredaram por uma rota de terra, cheia de buracos e lama. Adivinha? Era a rota errada e era tão ruim, mas tão ruim, que alguém falou: 
– Só falta a gente atolar para a viagem se transformar num verdadeiro tormento.
E não é que aconteceu? Um atolamento daqueles em que o carro afunda devagar, até a lama chegar no meio das portas, com todo mundo olhando, de boca aberta, sem poder fazer absolutamente nada. Foi a gota d'água. Uma gota grande que aflorou o  pior de cada um de nós. Afinal, os copos já estavam tão cheios de fome, cansaço e entraves, que transbordaram provocando brigas e muita confusão. Que mistura explosiva essa!

No meio do nada, um vai a pé busca socorro e não acha; outro tenta sair do carro atolado sem afundar na lama e não consegue; alguém tenta empurrar de lá, mas não dá certo; outro alguém tenta puxar daqui, mas também não dá. Até que apareceu 'O' caminhão. Depois de horas de desespero, finalmente o socorro tão esperado e carro atolado foi resgatado, rebocado por cordas e muita boa vontade. A sensação foi a mesma de quando vemos a mocinha ser salva nos filmes de cowboy. Só faltou o toque da cavalaria, que teria dado ao resgate a sua verdadeira dimensão.

Agora você deve estar pensando 'até aí, tudo bem' e eu concordaria se as idas e vindas pela Dutra não tivessem consumido toda a gasolina de um dos veículos. E como o dia era mesmo um daqueles em que não se deve levantar da cama, não foi possível encontrar nenhum posto aberto durante à noite, o que obrigou os carros a estacionarem para esperar o sol raiar, o que levou uma eternidade.

Não poderia piorar, não é? Mas piorou. Depois de abastecer e correr mais alguns quilômetros, chegamos na tal 'fazenda'. O lugar deve ter sido lindo há alguns anos atrás, mas estava mal conservado, caindo aos pedaços e com marcas de hospedes permanentes – enormes morcegos negros – em todas as paredes. Além disso, os pais da tal namorada nova não gostaram nada nada daquela invasão.

E então? Não parece maldição? Mais de doze, eu disse DOZE horas para ir do Rio de Janeiro à Miguel Pereira e ainda dormir com medo dos morcegos dividindo dois quartos de hóspedes com uma dúzia de pessoas.Vai chamar isso de quê? Olho grande, má sorte, destino, castigo. Pode até ser, mas eu vou continuar achando que foi maldição.

A essa altura você deve estar pensando 'coitados, deve ter sido um fim de semana horrível'. Só que está enganado de novo. A maldição só durou 24 horas e, apesar dos contra tempos, o fim de semana foi incrível, cheio de risada gostosa, de quem se lembra até das coisas ruins com prazer. Aquela risada que chega a dar água nos olhos e dor de barriga. E é por isso que eu sempre digo que não se render nunca e fazer graça da própria desgraça é a melhor opção. Passeios em pangarés, banhos de piscina, trilhas no meio do mato e tudo o mais que adoramos fazer quando ainda não conhecemos hotéis de cinco estrelas.
P.S.: Hoje, quando eu penso nos donos da casa tendo de aguentar e alimentar um bando de jovens desconhecidos por dois dias inteiros, me dá até um arrepio. Nada melhor do que mudar de ponto de vista, não é mesmo?

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